Conto Erótico - Química Perfeita - Capítulos 13 e 14


 Química perfeita 

Capítulo 13

Rafaello


Ainda tento controlar meus batimentos cardíacos, encostado na porta de madeira fechada dentro do meu quarto. Respiro fundo, mas o perfume de Sol, o mesmo que me tira do sério, é aspirado cada vez que puxo o ar e impede minha ereção de ir embora.


Estou insatisfeito, puto, excitado, arrependido e... não, porra, não estou arrependido! Foda! Bufo e saio do estado de letargia mental causado pelo intenso tesão que experimentei há pouco. O que essa mulher tem que me tira tanto do eixo? Será que foi por isso que meu irmão...


Merda!


Só de lembrar que ela pode estar dizendo a verdade e que realmente teve um relacionamento amoroso com meu irmão faz com que eu me sinta um canalha, filho da puta e traidor.


Não sei lidar com essa situação! Esqueço completamente quem ela é, com quem ela esteve relacionada quando estamos juntos. Eu só consigo reagir ao tesão que sinto, à vontade de conhecer seu corpo, de ter o seu prazer em minha boca, em minhas mãos, e dividir com ela essas sensações que pairam sobre nós e que parecem nos impulsionar um para o outro.


É assim desde que a vi, ao longe, na rua principal da cidade, e hoje à noite se intensificou de uma forma incontrolável. Eu consegui resistir ao meu próprio corpo e minha vontade quando a encontrei na cozinha. Não foi fácil, mas tentei me manter longe e controlar os pensamentos.


O pijama delineava todo seu corpo esguio, mas cheio de curvas nos locais certos. Entrei na cozinha, e ela estava de costas, não me ouviu, então fiquei parado feito um tarado voyeur apenas a observando, decorando suas formas, imaginando como seria tocar suas pernas, a bunda gostosa, as costas que pareciam firmes, e já estava excitado feito um garanhão.


Ela se virou para me encarar, e o que percebi me deixou sem ação por um momento. Sol também parecia excitada. O ar da cozinha mudou, minha pele parecia estar fervente, meu pau, já duro como pedra, pulsava descontrolado.


Tive que reunir todas as minhas forças – e pensar em coisas bem broxantes – para poder cumprimentá-la. Trocamos algumas palavras, e, quando me aproximei, ela se encolheu tanto para se afastar que temi ter entendido errado as vibrações, o clima entre nós.


Afastei-me, enchi a caneca de café, tentei focar em qualquer outro lugar que não fosse nela e, para me trazer à realidade da situação na qual estávamos, do motivo pelo qual ela estava na cozinha, perguntei se seu filho já estava dormindo.


— Já, ele dorme cedo e hoje estava cansado, brincou muito.


Sim, ele tinha brincado. Abri um sorriso ao me lembrar do moleque correndo nos fundos da casa, brincando com a mãe e Ida enquanto as duas cuidavam da horta.


Eu não queria ter espionado, mas estava na parte mais alta do galpão de produção e os vi do escritório do Gleyson.


— Eu sei, eu vi... — respondi e caí na besteira de olhá-la de soslaio, engasgando-me com a visão do seu rabo perfeito naquele maldito shortinho. — Puta que pariu!


Desviei os olhos rapidamente, meu pau enfurecido, o coração disparado, o desejo me queimando por inteiro.


— Você se queimou? — Sol pareceu preocupada e se aproximou, fazendo ser impossível que eu mantivesse o controle. — Quer um pouco de água ou...


Porra, por quê? Por que justo ela?


Segurei-a pelo braço e disparei:


— Você amava meu irmão? — a ideia era apenas retê-la até que me respondesse, mas o simples toque em sua pele acendeu uma fogueira dentro de mim. Tentei voltar à razão e questionei novamente: — Amava?


— Muito! — a resposta não era a que eu queria ouvir, principalmente por estar a encarando e não ver mentira em seus olhos e expressão. Sim, ela o amava.


— E ele? Amava você? — Senti-me um canalha por perguntar isso, procurando motivos para justificar meu erro por querê-la, mesmo sabendo que ela era dele.


Nunca competi com meu irmão em nada! Sempre aceitei, mesmo magoado com nosso avô, a preferência de Don Genaro pelo neto mais velho, nunca o odiei ou guardei mágoa, muito menos o invejei por isso.


Naquele maldito momento, eu o invejei pela primeira vez na vida.


Por causa dela!


— Eu acho que sim — respondeu, mas a vi titubear. A incerteza brilhava junto às lágrimas em seus olhos.


Ela “acha”?, pensei comigo, percebendo que ela não tinha certeza e que isso significava que ele nunca lhe havia dito. Franzi a testa, achando estranho, pois meu irmão nunca foi de esconder o que sentia.


— Acha? — inquiri, e ela assentiu. — Se ele te amasse, você não teria dúvidas, Sol. Peppe nunca foi de esconder o que sentia de ninguém, principalmente da pessoa com quem ele estava envolvido. Eu já o vi apaixonado algumas vezes, e, em todas elas, ele não deixou dúvidas.


Assim que acabei de dizer isso, arrependi-me. Senti-me como se estivesse julgando meu irmão, jogando-a contra ele, e isso era uma traição enorme.


Não era que eu achasse que estivesse falando mentiras, pelo contrário. Eu conhecia bem o meu irmão, acompanhei vários relacionamentos dele e, em todos, sabia quando ele estava apaixonado e quando a paixão acabava. Peppe prezava demais pela honestidade com suas parceiras, então, se ele estivesse apaixonado, se ele a amasse, ela saberia com certeza.


Se ele sentisse por ela o mesmo tesão que eu, não ficaria dúvidas.


— Eu não posso falar dos sentimentos dele, Raffaello, apenas dos meus. — Não escutei direito o que ela falava, concentrado demais olhando minha mão mexer em seu braço, o atrito das nossas peles e a forma como ela reagia a meu toque. — Éramos amigos, confidentes, e eu o achava incrível...


Não havia nenhuma dúvida também de que ela e eu tínhamos uma química surpreendente, perfeita!


— Ele fazia sua pele arrepiar desse jeito também? — falei automaticamente, sem pensar, enfeitiçado por seus pelos arrepiados. — Você reagia a ele como reage a mim?


— Acho que é melhor eu subir para o meu quarto. — Ela tentou recuar, mas não se afastou de mim. — Ao que parece, você bebeu e...


Sim, eu havia bebido a porra da tarde toda, mexido com as coisas que aconteceram naquele dia: a conversa com ela no vinhedo, a certeza de que ela não conhecia tão bem o meu irmão como dizia e, depois, a emoção partilhada com o pequeno Tomás na sala e a descoberta de que ela sabia da importância dos bonecos colecionáveis, coisa que quase ninguém sabia. Bebi, tomei cinco garrafas inteiras do vinho da casa – que não era de todo ruim, mas precisava de ajuda para ser melhor – ao longo da tarde e da noite.


Entretanto, não era por isso que eu estava fazendo todas aquelas perguntas a ela. Era somente porque não dava mais para negar o tesão.


— Eu não estou bêbado, Sol. — Ri, cheio de amargura, desejando que fosse tão simples. — Queria estar e usar essa desculpa, mas estou sóbrio. Algumas garrafas de vinho não me derrubam, sou resistente, então não tenho desculpa para essa canalhice toda. — Olhei para minha mão, já próxima da sua. — Eu não tenho direito de tocar você. Primeiro, porque não tive liberdade para isso, e, claro, por Peppe. — A simples menção do nome do meu irmão me trouxe de volta à realidade, e eu decidi controlar aquela porra toda que estava acontecendo comigo. — Principalmente por Peppe.


— O que está acontecendo?


Porra, ela ainda precisa perguntar?, pensei puto e ri de mim mesmo. Talvez estivesse bêbado demais mesmo, imaginando coisas e... Olhei para a pele dela novamente, seus mamilos duros, excitados contra o pijama. Não, não imaginei!


Mesmo assim, não era certo.


— Peço desculpas mais uma vez. Você tem razão, deve ter sido a bebida.


— Boa noite, Raffaello.


Ela passou por mim, o perfume delicioso me provocou, debochou da minha falta de controle e da covardia por ter deixado que ela se fosse. Xinguei, dei um pontapé no armário e saí de casa.


Andei no escuro, a lua alta no céu, até me cansar. Voltei para casa já de madrugada. Tudo estava calmo e silencioso. Tomei um banho, coloquei meu short para dormir, mas, antes que eu me deitasse, ouvi o chamado desesperado de Tomás e fui correndo para o corredor.


Fiquei parado à porta do quarto do menino, reticente, sem saber se deveria entrar para saber o que estava acontecendo ou se deveria acordar sua mãe. A simples ideia de ir ao quarto dela...


Não precisei, pois ela apareceu apressada, esbarrou em mim, fazendo meu corpo todo acender como luzes de Natal e depois toda nossa situação ficou ainda mais confusa.


Ligo o chuveiro apenas com água fria, disposto a arrancar os pensamentos sobre ela da minha cabeça. O que aconteceu há pouco não pode voltar a acontecer, embora eu queira muito. Eu devo respeitá-la, respeitar o relacionamento que teve com meu irmão – se isso for verdade – e me livrar desse tesão todo.


Gemo apenas em pensar no tesão, ainda evidente na minha ereção. Ficamos sarrando feito dois adolescentes virgens, nem mesmo nos beijamos ou nos tocamos sem as roupas. Só roçadas safadas e mãos bobas!


Madonna santa! Rio e seguro meu pau pronto para agir, mais uma vez, feito um guri de 12 anos.


Bem-vindo de volta a 1997!


— Bom dia! — cumprimento Ida na cozinha.


— Bom dia!


Ela coloca o bule com café na mesa, e vejo apenas uma xícara.


— Sou o primeiro a acordar?


Idalina ri e nega.


— É o último!


Franzo a testa e olho para o relógio da cozinha, conferindo que ainda são 8h da manhã. Sol e Tomás costumam acordar bem mais tarde que isso, bem depois de mim. É verdade que eu não acordei cedo como de costume, demorei demais a dormir depois de ter gozado em praticamente todos os azulejos do boxe.


O volume de porra acumulada me impressionou!


— Sol e Tomás foram para a cidade. Acabaram de sair — Idalina me dá a informação que eu queria sem que precise perguntar. — Foram visitar o amiguinho do Tomás, neto do doutor Casillo.


Neto?


— Filho de qual deles?


— André, o caçula.


Ah, sim! Amália disse que Sol e a cunhada são amigas.


— Eu não sabia que ele tinha um filho. — Sento-me à mesa. — É da idade de Tomás?


— Não, um pouco mais novo. Preparei lanches, porque, ao que parece, é uma festa tipo piquenique que as crianças vão fazer hoje. — Ela me oferece um sanduíche, provavelmente sobra do que preparou, mas eu nego.


— É aniversário ou...


— Não, acho que é uma festinha no parque, ou algo assim. — Ela ri. — A moça é um amor e faz uma torta que é minha perdição.


Tomo meu café em silêncio, com o pensamento de que é melhor que ela fique fora de casa por umas horas, talvez até seja suficiente para aplacar a loucura que foi ontem.


Tenho coisas a resolver hoje com Gleyson, além de ter que ligar para a França, coisa que não fiz ontem depois que falei com Arthur ao telefone. Estava tão confuso com tudo que, simplesmente, pedi a ele que providenciasse o DNA em tempo recorde, que parasse de enrolar.


— Vou entrar em contato com ela para pedir que faça o exame, mas, se ela se negar, teremos que entrar com um pedido judicial, e aí as coisas vão ser demoradas — Arthur explicou. — Se ela se negar, eu já terei a resposta.


— Pode ser, mas ela pode se negar se ficar ofendida ou algo assim. Já vi acontecer. De qualquer forma, você terá seu exame, mas se lembre de que temos prazo para iniciar o inventário, e que ele está se esgotando.


— Caso não o façamos no prazo, o que acontece?


— Multa. Pode parecer bobagem, mas, depois que você vir o montante que se paga para o governo apenas para tomar posse do que é seu, não vai querer dar mais dinheiro.


Bufei de raiva.


— Temos como mudar o inventário caso o DNA dê negativo?


— Temos, sim, claro!


Fiquei mais aliviado com essa resposta e pedi a ele que desse início ao inventário judicial. Caso se provasse que Tomás não era filho de Peppe, ele disse que poderia cancelar a ação e fazer no cartório, que era mais rápido.


— Mas isso tem que ser rápido, por isso vou agilizar a questão do exame, fique tranquilo.


Depois da conversa, acabei indo para o escritório do Gleyson a fim de falar sobre as entrevistas do pessoal para a colheita e acabei me esquecendo de ligar para a vinícola na França. Isso é algo que preciso resolver, pois já era para eu estar voltando e não vou poder fazer isso até que o exame de DNA saia.


Uma questão surge e quase faz com que eu me engasgue com o café. Estamos falando de DNA desde que descobri sobre a criança, mas em nenhum momento os advogados me explicaram como se fará esse exame. Eles precisarão exumar o corpo do meu irmão ou dá para se fazer de outra forma?


Levanto-me de repente, o que chama a atenção da Ida.


— O que foi? — indaga assustada. — Preciso falar com o Arthur! — Pego o celular no meu bolso e saio da cozinha para o pátio. O telefone chama até cair na caixa postal. Merda! Deixo o recado: — Arthur, ligue para mim, surgiu uma dúvida e gostaria de conversar.


A ideia de tirar meu irmão de seu túmulo, de seu descanso eterno, e submetê-lo a técnicos que, não sei como, irão pegar seu DNA, é macabra demais. Eu não gostaria de fazer isso!


Fico agitado, o pensamento incômodo não sai da minha cabeça, então decido ir até a cidade para falar pessoalmente com Arthur.


Antes de entrar no carro, No entanto, Gleyson me chama.


— Precisamos resolver umas coisas antes de contratar o pessoal.


Respiro fundo.


— Eu vou até a cidade, mas já estou voltando.


Ele percebe minha agitação e me pergunta se estou bem.


Rio, sem saber o que responder, pois me sinto meio louco nesses dias com tudo o que está acontecendo.


— Don Genaro deve estar incomodado que eu esteja em suas terras, então não tem me dado sossego também. — Gleyson arregala os olhos, e eu começo a rir. — Não, não estou vendo fantasmas, fique tranquilo!


Despeço-me dele e concluo que o que me assombra não é um fantasma, mas sim alguém bem vivo, de cabelos vermelhos flamejantes, corpo sensual e um cheiro que enche minha boca d’água.


Piso no freio, lembrando-me de que ela está na cidade com Tomás, local para onde estou indo. Rio de mim mesmo ao perceber que não preciso ir até o Arthur para resolver a dúvida que tenho, posso muito bem esperar que ele me ligue de volta.


— Patético, Raffaello! — falo comigo mesmo, voltando a dirigir rumo à cidade. — Você só arranjou desculpa para ir atrás dela! Patético!



Química perfeita 

Capítulo 14

Sol 


Ter que sair de casa cedo, sem me encontrar com Raffaello, foi um alívio! Mal dormi à noite pensando em tudo o que aconteceu e cheguei à firme decisão de que nada mais poderia haver entre nós dois.


É loucura, insanidade pura me envolver com ele!


A experiência que tivemos juntos naquele corredor escuro foi o ápice de toda a tensão sexual que pairava entre nós desde que nos conhecemos. Nunca foi assim com ninguém, e ter acontecido exatamente com ele é apavorante.


Sei que o fato de ter tido Peppe na minha vida irá freá-lo e que, por isso, será mais fácil de mantermos a cabeça no lugar quando tivermos que conviver. Ontem não pensamos, mas agora, com tudo mais claro, é mais fácil ver o caminho certo a se tomar, e, certamente, não é a cama dele.


Sinto um frio na barriga só em pensar nisso, mas tento não me concentrar nessa imagem mental. É hora de ter juízo, lembrar-me de todas as promessas que fiz por amor, por dever ou apenas por consciência pesada. Todas! Não importa as circunstâncias nas quais foram feitas, todas são válidas, e vou honrar cada uma delas. — Tudo bem? — Sara me pergunta preocupada.


Decido parar de viajar nos meus pensamentos e me concentrar na tarefa de arrumar a pequena mesa de armar que ela colocou em um cantinho na praça, debaixo das árvores.


— Tudo, estava criando a imagem da mesa na cabeça para poder decorála. — Coloco um pequeno arranjo floral que fiz. — Esse piquenique foi uma ideia ótima para um sábado de manhã.


Ela sorri orgulhosa.


— Eu sei, por isso queria tanto realizá-lo! É importante que as crianças tenham um tempo juntas mesmo fora da escola e experimentem comida saudável quando estão fora de casa.


Sim, concordo com ela. A inciativa foi ótima, e várias mães da cidade abraçaram a causa. Cada uma contribuiu com os lanches, todos o mais saudáveis possível, nada de comida rápida, tudo caseiro e delicioso.


Ida fez questão de preparar o lanchinho que Tomás trouxe, sanduíches feitos com pão que ela mesma fez, com fermentação natural, queijo branco que comprou de um produtor local e tomatinhos da horta.


Na mesa principal, além dos lanches, têm muitas frutas, sucos diversos todos naturais e água. Nada de açúcar, enlatados, gorduras e conservantes. Sorrio vendo a pracinha cheia, as crianças brincando com balões de gás hélio pendurados em seus punhos.


A ideia foi incrível, devo admitir.


Assim que cheguei com o Tomás, ele recebeu o balão com o nome dele escrito bem grande e legível. Mesmo de onde estou consigo ver o balão indo de um lado para o outro, assim como outras mães. A cidade é pequena, mas atrai muitos turistas por estar na rota dos vinhos, então todo cuidado é pouco.


— Bom dia! — Arthur Casillo me cumprimenta com um sorriso. — Isso aqui está uma loucura hoje. — Ri e olha em volta. — Mas é uma loucura boa!


— Sua cunhada é uma mulher muito especial.


Ele assente.


— Meu irmão é um homem inteligente. — Pisca quando eu balanço a cabeça por ele estar dando o crédito ao irmão. — É um evento muito bacana. Mesmo pequeno, consegue trazer mais pessoas para a área comercial e movimentar as vendas.


Assinto, vendo o lado frio e prático da coisa.


— Quer um suco? — ofereço-lhe, e ele aceita.


— Pode ser esse de abacaxi. — Ri de novo. — Não sei se crianças gostam de abacaxi; eu detestava.


— Detestava a fruta ou colocou na cabeça que não gostava antes de experimentar? — indago divertida quando ele faz careta, dando a resposta sem precisar falar. — Imaginei!


Sirvo um copo de suco de abacaxi com hortelã e aponto para o sobrinho dele, que completou dois anos há pouco tempo.


— Felipe cresceu desde a última vez que o vi.


— Sim, eu disse isso essa semana para o meu irmão quando ele o levou ao escritório. — Suspira. — Quando as crianças crescem, aí nós vemos que estamos envelhecendo.


Franzo o cenho, encarando-o, procurando por algum indício de que ele está velho e acabado; não tem. Arthur não deve ter nem 40 anos e já está filosofando sobre a passagem do tempo.


— Não vejo a passagem do tempo como algo ruim. Tudo tem seu tempo, já fomos crianças, agora eles são. É um ciclo de renovação, e isso me deixa feliz.


— Você é jovem, apesar de já ser mãe. — Olho-o mais uma vez, sem entender o que tem a ver uma coisa com a outra. — Como estão as coisas na vinícola? Já conheceu seu cunhado, pelo que sei.


Cunhado.


A palavra pesa em mim como se fosse puro chumbo.


— Creio que o doutor saiba como estão as coisas — sou direta. — Ele quer um exame de DNA para comprovar que Tomás é um Ferrero e disse que o advogado dele, que deve ser você, entraria em contato.


Arthur arregala os olhos.


— Não foi por isso que me aproximei de você hoje.


Viro-me de frente para ele a fim de olhar bem em seu rosto.


— Pode marcar o exame, doutor. — Arthur parece surpreso, e eu avalio que ele também deve ter dúvidas acerca da paternidade de meu filho. Minha intenção não é atrapalhar qualquer plano de Raffaello com sua herança.


Ele assente e sorri.


— Eu não pensei que fosse, Sol. — O advogado bebe seu suco. — Mas, de verdade, quando me aproximei, nem me lembrava dessas questões todas. Vim apenas porque queria conversar com você. A última vez foi há meses e muito rápido, quando tomamos um café na Trattoria da Sara. — Concordo, lembrando-me de que o achei muito simpático na ocasião. — Eu nem sabia que seu filho era neto de Don Genaro.


— Nunca vi necessidade de anunciar isso pela cidade — sou sincera. Eu não estava a par de todas as famílias daqui ainda, mal saí da vinícola durante o tempo em que permaneci na cidade. Só soube que sua família tratava dos assuntos legais da empresa e de Don Genaro quando ele estava no hospital, já morrendo.


— Pois é, nós nunca conversamos com tanta intimidade para que você me contasse que era viúva de Peppe, embora Sara e André soubessem disso desde o começo. Sorrio sem jeito e dou de ombros.


— Não sou oficialmente uma viúva. Não éramos casados.


— Mas viviam juntos, e isso foi reconhecido, pelo que sei, por isso o registro de Tomás com o nome de Peppe mesmo post mortem.


Sim, ele tem razão. Para fazermos o registro, precisei provar que eu e Peppe vivíamos juntos. Não foi difícil fazermos isso, meu irmão ajudou bastante na época, contratou um advogado bom que conhecia e tudo foi feito conforme a lei exigia.


Don Genaro achou que isso era suficiente, além de ter certeza de que Tomás era um Ferrero desde que o pegou nos braços. Pensei que ele pediria o exame de DNA, mas não o fez.


Suspiro, cansada demais de toda essa situação, desejando que fosse diferente, que não houvesse nenhuma herança e que eu pudesse viver tranquilamente com meu filho.


— Desculpe se a entristeci com essa história. — Arthur toca meu ombro. — Não foi minha intenção.


— Está tudo bem. — Forço um sorriso. — Eu não posso mudar o que aconteceu, mas juro que gostaria.


— Eu entendo. — Ele fica um tempo olhando para o copo em sua mão. — Já se passaram três anos, você não pensa em seguir em frente...? — Olhoo, sem entender aonde quer chegar. — Quer dizer... você é jovem, linda, poderia ter o homem que quisesse...


Já não consigo mais processar as palavras dele, tamanho espanto com o rumo do assunto. Arthur Casillo está sondando minha vida pessoal para saber se eu tive, tenho ou pretendo ter outro homem? Meu coração dispara com o medo de não saber qual o propósito de sua intromissão na minha intimidade sem eu nunca ter lhe dado nenhuma abertura para isso.


Ele é advogado do Raffaello, pode muito bem estar colhendo informações que poderão, de alguma forma, ser usadas contra mim em momento propício. Afinal, qual outro interesse ele teria?


— Arthur!


A voz de Raffaello me faz virar rapidamente em sua direção. Vejo-o caminhando a passos largos para onde estamos, o advogado e eu, seu corpo se movimentando com segurança, seu porte chamando a atenção de todas as mulheres, solteiras ou não, próximas ao caminho por onde ele passa.


Meu coração dispara, as mãos ficam suadas, a pele parece vibrar ou – não sei descrever – ser atraída por ele. É como eletrostática a química que temos, faz-me tremer, agita tudo dentro de mim, mesmo que eu não queira.


— Bom dia — ele me cumprimenta rápido, sem tirar os óculos de sol e volta sua atenção ao advogado. — Preciso tirar uma dúvida contigo. Liguei, mas não atendia e...


— Hoje é sábado, Raffa — a voz do advogado demonstra insatisfação por estar sendo incomodado em um dia em que não trabalha, mas não foco nisso, mas tão somente no jeito que ele chamou Raffaello.


Raffa! Sorrio involuntariamente, achando que o apelido o deixa mais descontraído. Raffaello é um nome muito grande, muito italiano, muito formal. Eu gosto de pensar nele como Raffa... principalmente se pensar nessa madrugada.


Balanço a cabeça e afasto o pensamento inoportuno.


— Não vai demorar. Podemos tomar um café na gelateria e...


— Amália não pode ajudar? — Arthur tenta se esquivar, e vejo a mão de Raffaello se fechar. — Tenho certeza de que ela irá gostar de ajudar você hoje, num sábado.


Amália? Puxo uma imagem para esse nome e então me lembro da morena de olhos azuis que é cunhada de Sara. O pesadelo de Sara! Apesar de seu jeito frio e – sim, eu tomei ranço por ela pelo modo com que trata a cunhada – esnobe, ela é uma belíssima mulher, moderna, bem-vestida, sofisticada e refinada.


Olho para o homem à minha frente, vestido com roupas de grife famosa, mesmo sendo casuais, óculos caríssimos e relógio que deve ser quase do preço de um carro popular. Sim, eles combinam!, penso desanimada.


Amália é o tipo de mulher que atrai o playboy dos vinhos, o tipo com quem ele era fotografado para as revistas chiques da Europa. Relembro minha própria roupa, um vestido de algodão leve, solto e meio hippie e começo a rir.


Nem com hippie chic eu chegaria aos pés das beldades que o acompanhavam!


— Disse alguma coisa engraçada? — Raffaello pergunta, encarando-me. — Não. — Paro de rir e fico constrangida. — Desculpa, eu estava prestando atenção em outra coisa. — Aponto para as crianças. — Vou deixar vocês conversarem a sós.


Raffaello entra na minha frente.


— Eu já estava de saída — informa. — Arthur já deixou bem claro que está de folga hoje e que não pode me atender.


— Raffa... — Arthur tenta falar, mas Raffaello não deixa, levantando a mão para impedir o advogado de seguir com seu argumento.


Mesmo com os óculos, posso sentir a intensidade do olhar dele. Respiro fundo para manter o controle e não demonstrar o quanto a sua simples presença mexe comigo.


— Aproveitem o dia — embora fale no plural, olha só para mim. — Eu não vou mais atrapalhar a diversão de vocês.


Ergo uma sobrancelha, sem entender do que ele está falando, mas sem nenhuma disposição para perguntar, apenas sorrio e agradeço. Ele parece ficar ainda mais tenso com minha reação, puxa o ar com vontade e, sem nenhuma palavra de despedida, volta pelo caminho de onde veio. — Não entendi o motivo de ele estar tão tenso — Arthur comenta. — Eu sei que ele quer logo ir embora do país, voltar para a França e para sua vida glamurosa de vinhos e modelos. — Ri. — Mas eu não tenho culpa se os planos dele foram frustrados assim que descobrimos o testamento.


Arregalo os olhos, sem entender.


— Testamento?


Agora quem parece confuso é Arthur.


— Sim, o testamento que Don Genaro fez antes de morrer, no qual deixa 25% dos bens para seu filho. — Fico ainda mais confusa, e ele parece perceber. — Você não sabia que, além dos 50% que Tomás tem direito, o bisavô também deixou mais 25% que tinha disponível para testar?


Fico lívida, sinto-me gelar como se todo o sangue parasse de circular no meu corpo. Eu não fazia ideia de que Don Genaro tinha deixado um testamento, muito menos de que tinha legado algo para Tomás.


Olho de novo na direção por onde Raffaello seguiu e agora entendo o que ele está sentindo, o motivo pelo qual ficou tão furioso quando descobriu que tinha um sobrinho. Não foi por apenas ter que dividir a herança com meu filho, foi porque praticamente ficou sem nada.


Um novo Gran Reserva!


A voz dele, magoada, volta à minha memória, e eu tento entender por que seu avô fez isso.


Continua amanhã 

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Conto Erótico - O Fazendeiro 🔥 Capítulo 01

Conto Erótico - Tr€pei no trabalho com meu patrão

Conto Erótico - Doutor Diogo - Capítulos 01, 02 e 03