Conto Erótico - Só por um ano - Capítulos 30 e 31
SÓ POR UM ANO
CAPITULO 30
BUQUES DE TALOS
Era sábado fim de manhã no Brasil quando o avião iniciou o procedimento de pouso. Vicente Max se tranquilizava. Voltava para casa após dez dias fora do país. Dedicou uma semana aos cansativos cursos sobre novas técnicas cirúrgicas que estão sendo adotadas na neurocirurgia. E acabou por estender a viagem, por mais alguns dias, e foi visitar amigos que viviam na Flórida. De início, Suna não havia gostado da decisão de ficar mais algum tempo, mas, posteriormente, ela compreendera que precisava daqueles dias por estar prestes a ter uma crise de estafa. Era um homem forte, contudo as avalanches emocionais que atravessara, nos últimos tempos desde a separação, haviam cansado seu corpo e alma. Necessitava digerir a própria existência, acertar os passos, pois não queria e nem podia mais derrapar feio. Nesses dias em solo americano, procurara Joshua Smith, um amigo que possuía compulsões semelhantes às suas e se mantinha casado por longos anos. Confidenciara a ele sobre ter aquelas vontades de ferir e sentir o gosto do sangue, mesmo estando casado com uma mulher não submissa. Smith abrira seus olhos para uma situação que nunca havia cogitado de maneira concreta: introduzir Suna no seu universo, não como uma fidelizada, mas como uma visitadora esporádica. Contudo, não sabia se seria capaz. Nunca permitira que aquele assunto avançasse entre eles. Suna tinha até insistido, em ocasiões mais recentes, mas sempre a cortava, apesar de aquela possibilidade povoar as suas fantasias. O certo é que pairava sobre ele uma aura de culpa, preconceito e desvio de comportamento. Nunca tinha sido compreendido. Diego zombava de sua sexualidade e Marcel a condenava como um pecado mortal. E ele mesmo passara a odiar-se e se culpar por seus gostos nada convencionais. É lógico que satisfazer esses desejos mais profundos não era primordial na relação com Suna. Nunca havia sido. Mas o amigo Smith o alertara que aquela negação à sua essência um dia seria cobrada e isso poderia prejudicar o casamento. A conversa com o amigo havia sido importante, mas cuidaria daquelas vontades obscuras no divã, tratamento que só tinha aceitado por causa de sua mulher. No entanto, naquele momento de sua história com ela, não poderia complicar mais a relação. Aquelas conjecturas ficariam para o futuro. A aeronave pousou, fazendo com que novos pensamentos aterrissassem na mente. Estava retornando para o que aconteceu à confeitaria. Fora acusado de incendiar a Doces Amores, mas o rapaz preso pelo crime não o havia reconhecido. Enfim, há dez dias vivenciara um dos maiores constrangimentos de sua existência dentro daquela sala de reconhecimento. Quando havia saído de lá, Marcel lhe comunicara que o incendiário não o tinha identificado. Até hoje não conseguiria descrever a profusão de sentimentos que havia transpassado o coração; uma mistura de alívio, contentamento e raiva. Ainda bem que Suna se mantivera ao seu lado, pois algo arranhara sua alma. Tinha sido horrível a sensação de ser acusado de ter cometido um delito grave sem que o tenha feito. Nunca se importou com punições, mas a possibilidade de ser penalizado por um ato que não tinha culpa o aniquilara. Havia enfrentado horas horríveis. Ainda saíra daquela delegacia direto para a clínica, atendera paciente entrando pela noite e viajara no outro dia. Naquele instante, retornava para aquela realidade obtusa. Afinal, quem desejava destruir sua relação com Suna? Pensava insistentemente em Bruno, mas a racionalidade pontuava que se o engenheiro e Suna não tiveram um envolvimento profundo, como ela garantia, o rapaz não teria tantos motivos para armar um atentado daquela envergadura. Afinal, havia sido apenas um flerte. O avião parou no finger de desembarque. Após quase onze horas de voo, desembarcou e as preocupações voltavam com força a importuná-lo. Mas aquele retorno reservava o lado sublime que era reencontrar a mulher que amava. Queria matar a saudade de Suna das formas mais lascivas possíveis. A ausência dela, naqueles dias, havia delineado ainda mais a importância que possuía para ele. E queria muito mais do que amorzinho, beijo e abraço, queria sexo intenso até o limite do possível, permeando as fronteiras da normalidade. Passou pelos procedimentos do desembarque internacional, o que consumiu um bom tempo, em seguida, apanhou as malas e foi para o saguão. Havia muita gente esperando familiares. Ansioso, procurou Suna e não a avistou. Uma certa frustração começou a se espalhar. Continuou parado numa segunda tentativa de encontrá-la e, então, avistou-a caminhando a passos largos em sua direção. Aquela imagem eclipsava quaisquer outras questões. Seguiu para encontrá-la. Vê-la revigorava os sentidos. Ao se aproximarem, deixou o carrinho de bagagem de lado e a abraçou com força, suspendendo-a do chão. Estava morto de saudades. Uma felicidade inebriante atravessou a pele e parecia florescer, como uma primavera, através dos poros, trazendo a sensação reconfortante de frescor, bem-estar e segurança. Fitou-a, por breves segundos, e a beijou de forma ardente. De repente, a leveza cedia território para um fogo de chamas invisíveis capaz de transpassar a derme a cada toque sobre o corpo da sua mulher. Pressionava as mãos sobre ela, tateando as partes possíveis de serem acariciadas em público. Teve uma ereção. Ainda assim, foi aliviando a intensidade do beijo, mesmo pensando em fazer amor o mais urgente possível. — Que saudades, meu amor... – murmurou sobre os lábios e, então, notoua choramingar. — Não faz ideia da falta que me fez, doutor Vicente Max – dizia ela e fungava. — Aconteceu alguma coisa? – num átimo de segundo, uma nuvem escura parecia pairar sobre eles, mas logo a sensação passou. — Está proibido de viajar e me deixar sozinha... – ela o envolveu nos braços e se aninhou em seu peito. — Não quero me afastar mais de você por longos períodos. — Poderia ter ido comigo se quisesse. — Eu sei, meu bem. Não vou mais deixar viajar sozinho, só em casos extremos – ela fitou sua bagagem. — Comprou Miami inteira! – Suna parecia tentar mudar de assunto enquanto caminhavam em direção à saída. — Comprei muitas coisinhas para você. Mas também trouxe algo bem precioso, a minha saudade e meu amor. — Ah! Com certeza, esses são os melhores presentes – Suna estampou um lindo sorriso nos lábios. — Também tenho surpresa... — Então, não vejo a hora de descobri-la – entusiasmou-se ele. — Vamos logo pra casa, meu amor... logo. Suna havia ido buscá-lo com o SUV. Após arrumar a bagagem no veículo, entrou no banco do carona, indicando que ela voltasse guiando. Assim que ela fechou a porta, tomou-a nos braços. Beijou-a de modo acalorado e faminto, com a mente sendo bombardeada por cenas eróticas que gostaria de colocar em prática, inclusive, as mais obscuras. Ansiava para estar dentro dela, aquilo era crucial. Pensou em possuí-la na mesa de casa, no banheiro, na cama deles e no carro... Recordou-se da última vez que tiveram contato íntimo no SUV. Enfim, não era uma boa ideia. Afrouxou o abraço, deu vários beijinhos e lhe mordiscou, com suavidade, o lábio inferior. — Vamos, Dona Su. Acho que nunca a vi dirigindo esse carro – disse com o olhar fixado no horizonte e a mente assaltada pela culpa. Ela apenas sorriu. ⁘ A surpresa que Suna havia preparado tinha sido a sala de estar remodelada, com novos móveis e objetos de decoração. Ela comprara um sofá gelo de forma alongada e elegante, poltronas bege, mesinhas e um novo aparador, sobre ele havia diversas fotos deles: no casamento, na casa de praia, no Chile e em outros passeios que fizeram juntos. Aquela iniciativa lhe dava mais certeza de que estavam caminhando como um casal e simbolizava a superação das dificuldades que os conduziram à separação. — Que lindo ficou, Su! Parabéns e obrigado pela surpresa – sabia que seus olhos brilhavam. — Eu... eu simplesmente, amei. — Foi uma loucura para conseguir que os móveis chegassem a tempo. Mas no final, deu tudo certo. Falta concluir a decoração... – ela demonstrava empolgação, ainda assim, sentia que algo não estava bem. Provavelmente, eram as preocupações com as obras de recuperação da Doces Amores, que já haviam começado. Voltou a fixar-se no aparador, aproximando-se. — Amo essa foto – eram eles em Huilo Huilo caminhando na neve, felizes e cheios de planos. Tentou apanhar o porta-retratos quando Suna soltou um gritinho, ao tempo que sentiu a resistência do objeto no vidro do móvel. Franziu o cenho e Suna arregalou os olhos. — O que há? — Precisei colar os porta-retratos com uma fita dupla-face de alto poder de fixação... – ainda continuava intrigado e Suna se mantinha um pouco constrangida. — ... por causa de Zazá. Ela iria derrubar caso suba aí. A decoração antiga era mais pesada. Aliviou a expressão e gargalhou. — Tudo bem, meu amor – envolveu-a entre os braços e a ergueu do chão. — Zazá é nosso amuleto de sorte. Mas, mudando de assunto, podemos inaugurar esse sofá, estou morto de saudades – confessava no ouvido da mulher. — Vou ficar feliz em tirar a sua roupa, beijar esse corpo inteiro, concentrar-me entre suas pernas, na carne linda, macia e molhada e te fazer ter um extenso e demorado gozo. — Ai amor, aqui na sala não... Vamos para o quarto. Prefiro lá, estou meio indisposta. — Indisposta? – afastou-se dela um pouco confuso. — Não precisa dizer isso, ou fingir dor de cabeça, ou qualquer coisa parecida, se não estiver a fim de fazer amor. Suna colocou a mão na cintura, fingindo indignação. — Vicente Max, você gosta mesmo de uma confusão. Nada disse sobre não fazer amor. Eu quero muito, por demais. Só quero que seja na cama, que é mais confortável. Além disso, está sob efeito do fuso horário. Imaginei que estivesse cansado. — Não pra você... Apanhou-a no colo, deixando as malas para trás e a conduziu ao quarto. Notou as roupas de cama novas, além de outros itens diferentes. Aquilo foi um afago ao coração, pois sempre quis que Suna entendesse que aquela era a casa e o quarto dela também. Contudo, naquele momento, tinha outras urgências mais importante, do que prestar atenção na decoração. Tirou sua roupa e Suna deixava o vestido cair no chão, revelando novas e ousadas lingeries, quase que totalmente tomadas por transparências. — Quer mesmo me provocar, não é, dona mocinha? — Quero que nunca abuse de mim – ela engoliu em seco, por causa do duplo sentido da palavra "abusar". — Quero que nunca enjoe de mim – completou sem perder o tom. Sua ereção já palpitava entre eles. — Sem chance de isso acontecer – deixou aquilo passar, pois já não refletia sobre nada. Arrancou-lhe um guloso e intenso beijo e foi degustar o sabor, o cheiro e a textura da pele de Suna em sua língua e lábios. Apertou-lhe os mamilos protuberantes, o que sabia que a excitava, provocando-lhe um gemido alto. O seu desejo gritava de uma maneira exigente, fazendo desistir dos entremeios. Precisava estar dentro dela, seu corpo parecia queimar numa febre de abstinência da mulher que amava. Com jeito, empurrou-a na cama, afastou a calcinha e a penetrou de modo forte. Suna emitiu um grito entrecortado e sibilante. Observou o semblante de dor dela e teve um impulso de continuar a movimentar-se, intensamente, e alimentar seu instinto. — Devagar, por favor – pediu ela com a voz rouca. Diminuiu as estocadas. — Te amo, minha Su – rendeu-se às súplicas, voltou a beijá-la, desistindo de alimentar os instintos mais vorazes. Num ritmo mais lento, sentia a pele macia da coxa de Suna encostar em seus músculos, os seios riscarem o peito e o canal vaginal massagear seu pênis, como se fosse um abraço apertado e quente. Escutava a respiração cadenciada da mulher e delirava. — Estava morto de saudades, morto – confessou num murmúrio. — Tava com saudades de ser devorada por você – disse ela quase como um miado. — Não seja por isso, vou te comer todo dia – movimentou-se mais rápido, por alguns segundos, fazendo com que ela soltasse um grito de prazer. Ali, no corpo da mulher que amava, encontrava o refúgio íntimo de um prazer capaz de ir ao gozo dos mais sacanas até o amor nobre, suave e terno. Era como adentrar numa caverna de segredos mútuos, de vontades atendidas e de outras ainda planejadas. Era o santuário de uma existência que o ligava a outra, através do prazer, e aquilo era mais um dos mistérios do mundo invisível. Assim, queria provar nos lábios daquela sacralidade profana. Tirou seu membro de dentro de Suna, deitou-se de ponta a cabeça e ela, em sintonia, postou-se de lado, preparada para ele, com as coxas abertas, oferecendo o sexo para ser saboreado. A pele rosada brilhava úmida. Beijou-a, acariciando o clitóris. Suna retribuiu sugando seu membro da forma mais deliciosa. E ficaram ali, trocando beijos, chupões e carícias íntimas até que os lábios adormeceram e chegaram ao orgasmo, praticamente, ao mesmo tempo. Então, voltou à posição inicial e a abraçou, mantendo-a sobre o peito, sentindo o cheiro de seu gozo exalar dos lábios e face de sua mulher e se misturar com o cheiro que ele próprio trazia da intimidade dela, num odor erótico e envolvente. Ela limpou o excesso do seu orgasmo com o vestido e permaneceram em silêncio por um longo período, sendo tomado por uma sensação de satisfação e bem-estar. Suna brincava com os pelos do peitoral e ele acariciava os cabelos dela. Então, ela se levantou. — Vai aonde, amor? — No banheiro e já retorno... — Vou tomar uma ducha contigo – ofereceu-se — Não amor, por favor. Não demoro – garantia ela. Ela se foi depois de recolher as peças de roupa e apanhar outras, limpas. Observou os movimentos daquele belo corpo. Ela era exuberante e aquelas formas, incendiárias aos instintos, eram um afago à alma e um acalento aos sentidos. Suna gostava de privacidade no trato de sua intimidade. Às vezes se dividia, em outras ocasiões preferia ficar só. Nesse sentido, sempre respeitava a vontade dela. Não demorou Suna retornou dentro de um short de algodão e uma camiseta. O seu olhar era diferente e estéril. Estranhou. — Max... — Sim! — Em sua ausência aconteceram duas coisas ruins – revelava ela. Contraiu os músculos da face e levantou o torso da cama para poder fitá-la. — O quê? O rosto de Suna se fechou como numa tempestade. Ela se aproximou e se sentou na cama. — Meu carro incendiou quando ia sair com ele – falou num rompante. Saltou da cama transtornado e um frio subiu pela coluna. — Que hora foi isso? Por que não me contou? – indagou num tom duro. — Decidi que não devia preocupá-lo em viagem – respondeu ela com calma. — Estou bem, estou aqui contigo. Uma sensação de medo e impotência o importunava. — Tomou a decisão errada. Deveria ter me contado, retornaria antes. Marcel sabia? Por que aquele filho de uma mãe nada me disse? Bufou aborrecido. — Eu pedi que não contasse. Balançou a cabeça indignado, passando a mão nos cabelos. — Como aconteceu? Como? – rosnava. — Acalme-se, Max. Desse jeito não vou poder te contar tudo – Suna endureceu o tom. Foi até ela e a abraçou. — Desculpa – fechou os olhos, apertando as pálpebras por mais segundos que o normal e a mirou. — Prossiga – só a possibilidade de algo ruim acontecer a Suna já o desestabilizava. — Na terça-feira, eu e Maya saímos da Doces Amores, por volta das cinco horas da tarde. O carro estava estacionado na mesma rua que coloco com constância. Dei partida, o motor embolou e senti uma pequena explosão, a fumaça subiu. Saltamos a tempo, antes que as chamas o destruíssem. — Meu Deus! – tornou-a a envolvê-la nos braços. — Seu carro não era velho! — Max, tudo indica que não foi acidente. Alguém quer nos destruir – fitaram-se por alguns segundos. Levantou-se desolado e começou a andar pelo quarto. — Não é possível! Isso é um pesadelo. Quando vamos ter paz! – gritou exasperado. — Primeiro, tentaram te culpar pelo fogo na Doces Amores e agora incendiaram meu carro. Balançou a cabeça aflito. — Alguém quer acabar conosco e quer te ferir para me atingir – constatava quase anestesiado. — Conheço muita gente e entre esses há os que me odeiam – inquieto, voltou a sentar na cama, apoiou os cotovelos nas coxas e enfiou a cabeça entre as mãos. Encheu os pulmões de ar, tentando retomar os prumos. — Vamos ter que voltar a utilizar os serviços de segurança – observou-a com cumplicidade. — Os mesmos serviços que te fez sentir perseguida. — Entendo. Mas não é só para mim, não é? Tem que ser pra você também. — Vemos isso depois. Vou ligar para César. Quer dizer, conversarei primeiro com Marcel – levantou-se. — Preciso tomar pé dessa situação. — Espere... – Suna segurou sua mão. — Não foi só isso. — O que mais? – aturdia-se. — Enviaram-me um buquê só de talos com espinhos. As rosas foram cortadas... Uma comichão tornou a subir a coluna, entrou em choque. — Quando? — Ontem. Um garoto de rua deixou na portaria do condomínio. Max, foi o mesmo jeito que me entregaram a caixinha com a prótese no ano passado. Será que Mércia tem a ver com isso? Os olhos de Max estavam dilatados e vidrados. — Não acredito. Só se estiver enlouquecida e rasgando dinheiro – mirou-a. — Mércia é uma mulher gananciosa, materialista, louca por dinheiro. Ela tem um patrimônio, enfim, conseguimos que assinasse promissórias altíssimas... Ela não arriscaria. — Não tenho tanta certeza assim. — E Bruno, Suna? Pode ser ele. Um engenheiro que perdia seus fins de tarde dando suporte a uma obra pequena de uma loja, ao invés de estar nos empreendimentos da empresa em que é empregado? Por sua causa, para te seduzir – desdenhou. — Não fala assim. Não tive nada com Bruno. E ele não chegaria a tanto – Suna se levantou, parecia sentir-se tonta, apoiando-se na parede. Max foi até ela, ajudando-a. — O que foi? — Tudo girou, de repente. Preciso ir no banheiro, depois te mostro o cartão. — Que cartão? — Que veio com o buquê. Só um minuto – pálida, ela partiu como um raio. Seguiu atrás de Suna, mas ela fechou a porta em sua cara. — Desculpe – gritou ela. — Não feche, pode precisar de mim... — Estou bem! Revirou os olhos impaciente. Vestiu um short, apanhou a roupa, encontrou o celular e jogou as peças de volta à poltrona. Mandou mensagem para Marcel, pedindo que fosse lá, em sua casa. Observou em direção ao banheiro e nada dela retornar. Foi até a sala, apanhou a bagagem e a colocou no quarto de hóspedes. Quando estava angustiado, não conseguia ficar parado. Abriu uma mala, apanhou as roupas sujas e as levou à área de serviço. Retornou para o quarto e Suna ainda estava trancada. — Está bem, meu amor? — Já estou saindo... Mais alguns segundos que pareciam eternidade e a porta se abriu. Ela saiu pálida. — Não está bem, vamos numa emergência. — De jeito nenhum. Meu marido é médico – ela foi até ele e o afagou. — Tenho isso. Quando o emocional ataca, não fica nada no estômago. Vomitei e vou ficar melhor. — Vomitar não é normal... — Foi emocional. Venha cá. Seguiu-a até a sala e Suna sacou da bolsa um envelope. — Veio num buquê de doze talos cheios de espinhos. — Que mente doentia! – disse ao tempo que abria o envelope e apanhava o cartão de tamanho médio. "Senhora Suna, "Esse buquê é para lembrá-la de que, no final, a dor é mais relevante do que o amor. Ao receber uma rosa, as pétalas se vão rápidas e ficam os espinhos. Assim é a vida. Teve o amor e sucumbirá com a dor dos espinhos. O fogo teima e um dia queima". Seus olhos se fixaram no papel impresso, quase sem piscar. — É uma ameaça velada – constatava. — Sim, a nós dois – concordava Suna. — Não contei a Marcel sobre esse buquê. Abraçou-a atônito, tentando planejar o que faria para protegê-la. Naquela altura, todas as pessoas próximas se tornavam suspeitas. ❀✿❀✿ Suna pedira comida num restaurante próximo ao condomínio. Ela se sentia fadigada, angustiada e sem coragem de se aventurar na cozinha. Os incêndios na confeitaria e no seu carro, além da mensagem de ódio que recebera no buquê de talos fizeram com que desmoronasse. Realmente, o medo havia se instalado na alma. Temia por sua vida e pela de Max. Receava de que fossem vítimas do fogo, afinal, o cartão se remetia à dor e insinuava que um dia as labaredas chegariam. Não sabia se a mensagem se referia a eles de um modo figurado ou direto. Um frio subiu a espinha. No entanto, esforçava-se para demonstrar a Max que se mantinha calma. Sabia que, se ela entrasse em desespero, ele poderia descontrolar-se e a situação se tornar mais tensa e caótica. Precisava manter-se serena e, com isso, ajudá-lo a encontrar uma saída. Max era inteligente e, quando se focava de modo racional numa análise de conjuntura, sempre encontrava as melhores soluções. Confiava nele e em suas decisões. Max e Marcel adentraram numa conversa afinada desde que o irmão chegara em casa. De início, acompanhara-os no escritório, o qual tinha passado a ter acesso desde que havia retornado. No primeiro momento, eles descartavam a participação direta de Mércia, mesmo assim, Marcel pretendia abordá-la. Após o almoço iriam prestar queixa na delegacia. Max passara a concordar com Marcel de que ela falhara, por não ter ido fazer um boletim de ocorrência assim que a perícia apontara para a possibilidade de seu carro ter sido sabotado. — Suna, devia ter escutado o seu irmão e ido à delegacia – Max a censurava inquieto, da poltrona de seu escritório. Respirara de maneira ruidosa. — Quis esperar você retornar, Max. A queixa na quarta-feira ou no sábado não irá mudar nada. Além disso, o resultado oficial da perícia só sai na segunda. — É que tem o precedente do incêndio à confeitaria. Tinha lhe falado – alegara Marcel. — Podem dizer que sou teimosa e cabeça dura, não ligo – eles riram e não se importou, pois, ao menos, houve aquele ponto de relaxamento, dentro da atmosfera de ameaça que pairava sobre eles. — Vou apanhar a comida e servir para nós. — Precisa mudar, Su, e aprender a escutar os outros – dissera Max meio zombeteiro enquanto saíra do escritório. — Quer dizer, ouvir as pessoas que te amam... — Vocês dois juntos são meu inferno astral – tinha pilheriado da porta antes de sair. Naquele momento, almoçavam o robalo assado, acompanhado de legumes cozidos no vapor, arroz branco e batata gratinada. A comida começou a dar voltas no estômago, então, logo desistiu de almoçar e brincava com o garfo, evitando que a notassem. Max engatou uma conversa sobre o clima nos Estados Unidos e o verão no Hemisfério Norte. Participava minimamente da conversa. Andava desconfiada, nas últimas duas semanas. A menstruação estava atrasada. O fluxo era para ter chegado dez dias após o quarto Afrodite e já havia se passado dois meses desde que tiveram aquelas duas noites no motel. Suspeitava estar grávida, afinal, não usava nenhum anticonceptivo e tinha retomado uma vida sexual intensa. Aquilo poderia ser maravilhoso e blindar ainda mais a sua relação com Max, no entanto, o momento era inoportuno, com todos aqueles acontecimentos estranhos e ameaçadores os rondando. Não pretendia fazer teste de gravidez e nem contar a Max sobre essa suspeita, pois poderia ser apenas uma impressão passageira de mulher e o atraso menstrual e os incômodos, ter cunho emocional. Serviu sorvete de limão e o sabor azedo da iguaria afagava o paladar. Quando terminaram, levou a louça para a pia, Max e Marcel ajudaram a guardar o resto da comida em recipientes plásticos. Enquanto Marcel os guardava na geladeira e colocava no lixo as embalagens do restaurante, Max limpava a bancada. Admirava aqueles homens, tão empertigados em suas profissões, colaborarem nos afazeres da cozinha. Certo que aquilo era para ser normal, mas nem em todos os lares era uma realidade. Voltou a se concentrar na louça que lavava. De supetão, Max a envolveu por trás e viu que Marcel se dirigia para a sala de televisão. — Vamos superar mais esse obstáculo e nos manter fortes – sussurrou ele no seu ouvido. — Iremos, sim – acariciou o braço dele com as mãos molhadas. Sentiu a pressão do sexo de Max em suas nádegas. — Saiba que ainda não matei toda a minha saudade. — Mesmo nesse caos? É um insaciável... – comentou com preguiça e fechou a torneira. — Foram dez dias sem você, além da saudade acumulada do tempo em que estivemos separados. Acha que é assim? Que essa saudade já foi estancada? – ele riu. — E esse estresse não te afeta? – voltou-se para ele. — Muito! Aumenta o meu tesão. Me deixa de pau duro toda hora – ele confessou baixinho e riram. — Meu marido é quase um maníaco incorrigível – abraçaram-se sem se importar com as mãos molhadas. — Não espere que eu mude nesse sentido. Já passamos um ano juntos e sabe como é. — Sei sim, no quesito safadeza é quase sem limites – pontuou ela. — Bem, há muito a viver ainda, um pouco além das fronteiras, mas nada que não queira. — Hum. A discussão do que é limites pra você daria uma dissertação. São as linhas limítrofes que sua mente insiste para serem burladas. — Não vamos tratar disso entre nós e, sim, com ajuda de um profissional, o terapeuta. Mas não é hora de pensar nisso. Sou muito feliz com você, como somos, como nos entendemos e nos relacionamos – confessava ele com uma sinceridade única e depois, cobriu os seus lábios com um beijo suave e os braços cruzados sobre sua cintura. Em seguida, o semblante dele se fechou e crispou a testa, afastando-se um pouco sem tirar as mãos de sua silhueta. — Agora, preciso que seja forte e procure sair menos, se expor o mínimo possível, mesmo com a contratação de seguranças. Por favor, não teime. Tenho muito medo por você. — Também estou temerosa, por mim e por você. Também não quero que se exponha. Preciso de você bem e do meu lado. Sua vida é importante para mim, é preciosa em demasia. — Fico feliz em escutar isso – confessava ele com uma ponta de emoção em sua voz. — Não faz sentido viver sem você, necessito que se mantenha íntegro. Não banque o herói, como fez indo atrás de Dante, imploro, eu imploro – enterrou o rosto no peito dele. De repente, uma dor visceral dilacerava a alma. Lágrimas vieram aos olhos sem pedir licença. Apertava-o com força. Não conseguiria se imaginar sem Max. Os períodos separados tinham sido horríveis e se algo de pior acontecesse com ele, desejava que ocorresse com ela também. Não teria forças para suportar. Soluçou. — Não fique assim, amor. Vamos descobrir quem é o filho ou filha da puta que está fazendo isso conosco – ele a afastou do peitoral e beijou carinhosamente seus olhos, limpando as lágrimas com os próprios lábios. — Prometa que não fará nada pensando apenas em me proteger e se colocando em risco. Prometa! – exigia com a voz trêmula. Max expirou de má vontade. — Suna, não sou homem de admitir ameaças ao que amo. O que aconteceu custará caro a quem fez, muito caro. Suna exasperou-se. — Não se meta em nada fora da lei. Jure pra mim que deixará a cargo da Justiça. Jure, Max, por favor... – já estava um pouco descontrolada e tateava o próprio prumo para impedir que a situação ficasse mais difícil. Max se mantinha em silêncio. — Se me ama como diz, saiba que não vou sobreviver sem você. Nos tempos separados, perdi muito peso e me abati, não tenho condições de suportar... Se quer me ver bem, precisa se preservar e se guardar pra mim. É o meu tesouro... e só descobri a intensidade e abrangência dos meus sentimentos quando nos separamos. Promete que vai se cuidar, por favor, e que nada irá nos separar – a emoção espalhava-se à flor da pele.
— Calma, minha bebê – ele tentava confortá-la e ela buscava forças para controlar-se. — É minha vida, Suna. Soluçou e fungou. — Devia ter aceitado ir embora contigo – arrependia-se. — Amor, não se culpe. Não podemos viver acuados. Ir embora só camuflaria a identidade de quem está por trás do que aconteceu. Alguém quer nosso mal e essa pessoa maléfica está solta por aí. Desconfio que é muito mais do que ódio puro e simples, há uma grande dose de obsessão e loucura nos perseguindo. Preste atenção... – Max abaixou levemente o ombro e pescoço para encará-la melhor. — Mércia e Dante caberiam bem nessas descrições, mas eles estão de mãos atadas. Então, vamos retomar uma suposição deixada de lado e seguir a linha de que tem alguém querendo me afetar, que tem a ver com as ameaças e agressão a você feitas por Dante. Muito provavelmente, essa pessoa quer me prejudicar muito antes de a gente se conhecer, estimulando Mércia a continuar com suas intrigas ao meu respeito e em sua busca por provas sobre a minha vida sexual. De lá para cá, só pode ter havido um mentor, um arquiteto, manipulando Dante e Mércia. Esse é fio da meada. E tenho desconfianças... – concluía ele com o ar de mistério. — Quem? – contraiu a testa e abriu ainda mais os olhos, curiosa. — Não quero fazer acusações injustas... mas uma segurança ficará em sua companhia no tempo em que estiver em casa também. Arrepiou-se por inteiro. — Mas ... não tem necessidade... — Prometeu não criar problemas – alegou Max. — Desconfia de Dulce? — Todos que conhecem minha intimidade. Só retiro seu irmão desse grupo, porque ele já me deu provas suficientes de fidelidade. Todos os pelos do corpo de Suna eriçaram e uma onda fria e medonha se dissipou na pele. — Meu Deus! — Enfim, não quero que conte a ninguém detalhes de nossa vida, ou sobre os seguranças que começarão amanhã, ou sobre suas atividades diárias, nem a Maya. — Maya? Ela é de extrema confiança! Nada tem a ver com isso... – indignou-se. — Não sabemos. Estamos sendo vítimas de uma rede de intrigas e loucuras. Além disso, sua amiga tem uma vida obscura. Ela esconde coisas sérias e Marcel sabe disso. — Eu sei disso. E ela admitiu que fez coisas erradas antes. Ela sofre e foge desse passado. — Quem comete algo errado uma vez pode fazer outra, por centenas vezes. Só precisa de um estímulo, um motivo. É diferente de quem nunca cometeu deslizes. Não se deixe enganar, quando o muro entre o correto e o ilegal é derrubado, transpassar de um lado a outro se torna muito mais fácil – explicava com um semblante de seriedade e introspeção. — Vamos, se arrume, pois iremos prestar queixa – girou de volta para a pia. — Deixe essa louça para depois, venha. ⁘ O sol já ensaiava se por, naquele fim de tarde de sábado, e os nervos de Suna queriam obscurecê-la, mas resistia a entregar-se à noite escura que se abatia entre eles. Naquele dia, tornara-se ainda mais vulnerável ao que acontecia. Não sabia qual era o motivo, se por Max ter voltado e temer pela vida dele, ou se era por desconfiar da gravidez no meio daquela turbulência. Estava muito sensível e preocupada. Havia chorado no caminho de ida à delegacia, ao escutar as conjecturas de Max e Marcel. Todos tateavam às cegas sem saber quem confabulava as maldades e ameaças. Durante o retorno, um silêncio sepulcral recaía sobre eles. Não sabia o que acontecia com ela. Sempre gostava de tomar suas decisões, era dura e atrevida, porém, naqueles momentos, estava chorona, tensa e entregando as decisões nas mãos do marido e do irmão. O tempo parecia inquietante. Depois do carro incendiado, tinha medo até de acordar, queria ficar deitada por horas a fio. Às vezes sonhava com chamas ao redor da cama. E agora o futuro a amedrontava. Receava por ela e, principalmente, por Max, devido ao temperamento explosivo dele, ainda que o marido lidasse melhor que ela em situações limites. O delegado havia assegurado que intensificaria as investigações. No entanto, aquilo não estendia garantias a eles. Chegou em casa tensa e cansada. Disse a Max e Marcel que iria deitar-se. Foi para o quarto, trocou a roupa por um vestidinho solto e mais confortável e se aconchegou na cama. Quando os pensamentos começaram a aquietar-se e as pálpebras relaxavam, Max entrou pisando leve e sentou na cama, ao seu lado. Abriu os olhos e se deram as mãos. — Preciso te dizer algo... – começou ele, de modo brando. Uma comichão espalhou pelo corpo. — O que aconteceu? – quis saber em alerta. — Nada, não aconteceu nada. É que resolvemos conversar com César e ele vem aqui daqui a pouco. — Sim e o que tem se ele vier... Max inspirou, profundamente, e o olhar se perdia. — Lembra-se de Elisa, a fidelizada? Para que recordar daquela mulher! Uma raiva percorreu os sentidos. Sentou-se na cama quase amuada. — Claro! Como esquecer? – disse num tom grave e cruzou os braços sobre o peito. — O que tem? Foi ela quem armou tudo, por acaso? — Calma, Suna. Não é isso. Ele tocou seus antebraços. — Prometi não a enganar mais, mesmo por coisas bobas e simples – Max buscou acolhimento em seus olhos. — É que Elisa está se relacionando com César. Eles são namorados. Crispou a testa intrigada sobre aquele improvável casal. — Ela também vem? Não é possível! – inquietou-se e Max pressionou um pouco o seu braço. — Não, Suna. Ela não vem. Mas quero que saiba que ela é a atual companheira de César, caso algum dia os encontremos em algum lugar. Soltou todo ar dos pulmões. — A mentira se tornou verdade, então. Pois você tinha dito que Elisa era namorada de César quando ela era sua fidelizada. Suas palavras se concretizaram – observou ela com desdém. — Ele sabe do relacionamento que tinha com ela? — Não tinha relacionamento. Tinha um contrato. Sim, ele tem conhecimento. — Tudo bem... – disse e voltou a deitar na cama dando as costas para Max. — Espero que saibam o que estão fazendo. — Suna, você está muito arredia – ele lhe deu um tapa nas nádegas. — Continuaremos à noite... – concluía e lhe mordia com força o seu traseiro, fazendo com que soltasse um grito. Max saiu. Ficou pensando na morena mignon que foi amante dele e agora enamorava o forte César. Até que Elisa tinha bom gosto, César era um cara bonito e os biótipos deles combinavam. Só torcia para que não tivesse que encará-los juntos nem tão cedo. Refletiu ainda sobre a atitude de Max, em ter confidenciado sobre o que acontecia entre Elisa e César. Sentiu-se culpada. Ele se portava de maneira comprometida e, por sua vez, ela escondia que desconfiava estar grávida. Não agia conforme tinham combinado. Apertou os olhos e tomou uma decisão. Apenas contaria a Max quando fosse fazer o teste e isso só aconteceria após vislumbrar um norte para a situação que eles enfrentavam. Aquela atitude podia parecer cruel, contudo precisava protegê-lo de uma carga maior de tensão. Ele já estava aflito, se soubesse que estava grávida iria torturar-se ainda mais. ⁘ As horas saltitaram no tempo. Teve uma boa dose de descanso. Max entrou no quarto, chamando-a para jantar. Ele havia pedido pizza. Levantou-se e foi à cozinha e, assim que entrou no ambiente, o cheiro do queijo derretido e massa quente, fizeram o estômago revirar. Desistiu de qualquer fatia e optou por um copo de iogurte. — César ajudou em alguma coisa? – quis saber sentada diante de Max. — Contamos para ele o que a polícia sabe. César tem contatos e vai começar a investigar em paralelo. — Confia nele? — Sim. — Ele não tem ciúmes de Elisa? — Se tem, não deixa transparecer. — Raiva do que você fez a ela não pode ser uma motivação para os incêndios? — Poderia, caso César não precisasse estar fazendo o mesmo que eu fazia. Parou e o fitou estatelada. — Como? — Elisa é uma submissa e masoquista – visivelmente, Max se desconcertou, com uma fatia de portuguesa na mão. — Ela sente prazer na dor – finalmente ele disse de uma vez só. — Suna, trouxe um smartphone novo para você, um notebook também, uma bolsa e algumas peças de roupa. Vamos ver quando acabarmos aqui? – ele tentava mudar de assunto. Ainda estava encabulada. — Vamos sim... mas, mas... me explica melhor – as sobrancelhas se uniam curiosas. — César fere Elisa e ele gosta disso também? — Vamos lá no quarto de hóspedes, ver seus presentes agora – ele deixou a pizza no prato e se levantou. — Vicente Max, não fuja do assunto... ele também gosta? – continuava sentada. O mundo era pervertido ou a dinâmica do prazer era muito mais ampla do que conseguia imaginar. Ele expirou e fechou os olhos. — Não devemos tocar nesse assunto. Levantou-se, tirou o copo da mesa e pôs na pia. — Estou curiosa... responde, por favor. — Para que saber tantos detalhes da vida íntima dos outros? – reclamou ele aborrecido. — Porque esses detalhes têm relação com a minha vida íntima, de algum modo. Responda, Vicente, sem receios de me machucar. Afinal, César gosta do mesmo que você? – voltou-se para ele e, também, subiu o tom. — Nossa, Suna! César não gostava, talvez tenha passado a gostar, não sei detalhes... mas... faz para agradá-la... – confessava ele de má vontade. Aquilo poderia parecer banal, mas era significativo. Se César tinha se rendido aos desejos loucos de Elisa, então, ela também poderia fazer o mesmo. Sim, deveria, como havia sugerido desde que reataram. Max havia se descontrolado, contudo, aquele episódio no estacionamento do hospital tivera relação com a raiva dele e não com sexo em si. Acabaram de arrumar a cozinha em silêncio enquanto a mente insistia em lhe recordar dos vídeos que assistira entre Elisa e Max, porém sem a intensidade da fúria e da mágoa. Depois Max foi entregar-lhe os presentes que trouxera. Ficou boba. Ninguém nunca a tinha enchido de mimos como ele fazia, sempre lhe dava o que havia de melhor e, além de tudo, tinha bom gosto. Max foi tomar banho e ela apanhou um objeto no escritório, que estava guardado na peça. Em seguida, observou-se no espelho com calma. Alisou a barriga sem sinais de gestação, mas que parecia um pouco dura. Sentiu os mamilos roçarem o tecido, de um jeito diferente, e um pouco de dor na lombar, como se fosse menstruar. Posso estar enganada, pensou. Apagou a luz, deixando apenas a iluminação dos abajures. E, depois, foi tomar uma ducha com ele. Entrou no blindex sem que Max esperasse e o envolveu em seus braços. — Que surpresa boa! – elogiou ele. — Disse que queria continuar, então, estou aqui. — Nem cansado e debaixo d'água, consigo acalmar as labaredas do meu coração... – ele riu. — Esse papo de fogo está nos rondando, hein – apertou o membro dele que já estava enrijecendo. Agachou-se e colocou o sexo na boca, sentindo a pele lisa e fina entre os lábios e na língua, também deslizando sobre as onduladas veias cavernosas. Concentrou-se na glande, chupando-a e a massageando com a ponta da língua dentro da cavidade bucal. Max gemia, apoiando-se entre o revestimento. A água do chuveiro caía torrencialmente sobre eles. Ficou ali, deleitando-se da intimidade viril do seu marido, por longos minutos, controlando a sensação de fraqueza e uma leve náusea. Queria muito daquela noite. — Vamos continuar na cama – pediu com a voz aguda, ao se levantar e o abraçar. Em seguida, pegaram as toalhas e se enxugaram de modo atrapalhado e rápido e seguiram para o quarto. Pingos de água se espalhavam pelos corpos mal enxutos. — Você está quente essa noite, dona Su – comentou ele, puxando-a para seus braços. Beijaram-se longamente e Max lhe oferecia o afago másculo e exigente, que parecia sugar sua essência por entre os lábios, tocando-a de maneira sensual e instigante, apertando os mamilos já muito sensíveis e massageando o clitóris úmido. Em seguida, ele a deitou na cama e a penetrou devagar. O peso másculo e ousado dele se espalhava por sobre o seu corpo. Soltou um gemido forte. Os movimentos dele se intensificaram, batendo entre suas coxas, espalhando no ar o estalo do choque entre as carnes de ambos, o que era excitante. Teve receio de que Max fosse gozar e interrompeu a penetração. — O que foi, amor? – indagava ele, como um gato languido enquanto afastava o torso dele de cima de seu corpo e alcançava a caixinha no criadomudo. — Use isso agora... – tentou falar com tom de exigência, e sua voz saiu esganiçada ao estender a prótese ortodôntica que ele usava para ferir Elisa. — Está louca! Não... isso não – rebateu ele, com veemência, levantando-se da cama. — Tínhamos combinado. É um erro – a voz dele demonstrava tensão. — Vamos ter ajuda de um terapeuta com relação a isso. — Eu quero muito e não é um erro. Venha, não quebre o clima. — Não posso, Suna. Lembre-se da outra vez que extrapolei com você. — Não ligo, venha. Por favor, eu quero muito. Desde que voltamos, passei a ter esse desejo. Nem que seja uma única vez, me machuque. Max, me fere como sempre quis... eu quero. Ele a fitou com os olhos brilhantes. — Não sabe o que diz, brinca com fogo. — Sei o que estou desejando. Venha – fitou-o com o olhar pidão, mostroulhe o pescoço, passando o dedo na nuca de modo sexy e abriu as pernas, como num convite velado ao sexo. — Não quero pedir nada, quero que me dê ordens. Quero que seja bruto e estúpido – sussurrou. Escutava a respiração ruidosa dele se intensificar e, da penumbra, vislumbrava o movimento angustiante de seu peito. — Não se oferece assim, porque não vou resistir. — Quero que ultrapasse limites, que me tenha inteira, totalmente. — Nossa... uma única vez, Suna, e do meu jeito... — Tudo do seu jeito, venha. — Espere – ordenou ele. Um frio percorreu a coluna enquanto Max foi no armário. Será que daria certo? Estava curiosa. Ele retornou com uma gravata na mão. Sobressaltouse, mas nada indagou. — Sou sua, totalmente sua – afirmou com convicção. — Vire-se, não verá nada... Seja boazinha – ela obedeceu e ele vendou seus olhos. — Vou fazer amor com você às cegas... Após vendá-la, ele a puxou com rudeza e a beijou de modo guloso. Logo passou a sugar sua língua e lábios com muita força. Ele a colocou ajoelhada sobre as próprias pernas e se sentiu apreensiva. O que aconteceria? Não enxergar aguçava os sentidos. O coração apertou de ansiedade. Sentiu os dois dedos dele transitarem de modo suave em suas costas. Arrepiou-se por inteiro e a excitação era sentida entre as pernas molhadas. Ele a empurrou pelos ombros. — Fique de quatro... – atendeu a instrução e um silêncio se perpetuava até sentir uma primeira sova nas nádegas. Max a estapeou diversas vezes e prendia o grito, pois temia que ele parasse. — Que linda! Toda vermelhinha... Ai, Suna, como queria te esfolar inteira – disse ele e massageou os seus glúteos. Aquelas palavras amedrontavam o coração. Arrepiou-se. Depois, sentiu-o mudar de posição e as expirações quentes resvalavam sob a pele das costas. Ele retirou o cabelo e parou sobre seu pescoço. Esperava a mordida, o sangue parecia correr nas veias como labaredas. Quando menos esperava, ele a empurrou na cama e soltou um grito abafado de susto. Max a xingava dos mais levianos nomes e forçou a abertura de suas pernas bem mais do que tinha elasticidade, provocando dor e incômodo. Percebeu que ele mudou de posição na cama e o coração disparava apreensivo. Virou a cabeça de um lado ao outro, o corpo parecia prestes a explodir. Quando menos esperava, recebeu uma penetração virulenta, como se estivesse abrindo-a ao meio. Soltou um grito. — Não é o que queria? — Sim... – miou. — Tome... – ele moveu-se com mais força e rapidez, fazendo-a gemer. Max apertou um de seus seios com tanta estupidez que teve vontade de chorar. Os movimentos e os impropérios continuaram até que sentiu o rosto dele se aproximar de seu pescoço outra vez. Acostumou-se com o incômodo e voltou a ser dominada pela euforia pelo que iria acontecer. Os mamilos enrijeciam, o ventre parecia prestes a estourar de uma expectativa leviana. Esperava uma mordida brusca a qualquer momento, mas ela não vinha. A respiração era curta. Ele a cheirava e passava a ponta da língua em sua pele. A dor e o prazer se misturavam numa dança louca dos sentidos. O coração disparava como um cavalo arredio, numa inquietação pelo porvir. De repente, ele parou e a virou de costas, puxando com força o seu cabelo, fazendo com que sua cabeça se virasse. Sentiu a língua dele entrar em sua boca. Urrou outra vez e sentia seu sexo latejar excitado. Max voltou a penetrá-la de quatro e teve a impressão que seu canal vaginal feria. Ele passava os lábios próximos ao pescoço e uma energia forte se concentrava na base do seu abdome, aguardando a grande mordida, porém, ela não chegava. Ele interrompeu a penetração, jogou-a estupidamente na cama e tornou a abrir suas pernas. Parecia que iria fazer sexo oral. Ele passou a ponta da língua no clitóris e gemeu alto. Quando começou a gozar, sentiu uma dor insuportável na virilha. Gritou, desesperada numa mistura de gozo e espasmo, grunhia incessante entre aquelas estranhas sensações. — Não – rosnou ele, como uma ordem, quando sem perceber, estava com as mãos na venda. Respirou rápido entre o prazer que se acalmava e o desespero, sem saber direito a insanidade que tinha concordado em fazer enquanto ele mergulhava os lábios em sua virilha, passando a língua em algum lugar que causava ardor. Com certeza, estava ferida. Ele voltou a morder o local com mais suavidade. Sua respiração se intensificou e o coração parecia um tambor. Num impulso, colocou a mão na cabeça dele, que a rebateu num rápido movimento, quando se levantou e se jogou sobre seu corpo, prendendo suas mãos acima da cabeça e voltando a penetrá-la. Ele a beijou e sentiu o gosto do próprio sangue nos lábios dele. Não demorou e Max entrou em êxtase, soltando um grito animalesco, num gozo alto e despudorado. Depois, ele se manteve sobre ela. Nada disseram um ao outro enquanto escutava a respiração acelerada de Max. Assim que se acalmou, saiu de cima dela, retirando sua venda. — Me perdoa... Isso foi horrível – disse ele com os olhos cheios de culpa. — Não, não foi... Max mergulhou a cabeça em seu peito. — Foi. Por que sou assim? Eu não sei, eu não sei... — Gostou? – ela quis saber. — Isso não é pergunta – rebateu ele. — Vou perder a minha perna – quis imprimir um tom de humor, mas, no fundo, estava preocupada com a ferida. — Não – ele se levantou e foi olhá-la ao tempo que erguia o torço, curiosa. Havia dois pequenos furos de meio centímetro cada e sangue coagulado ao redor, respirou mais tranquila. — Por que escolheu aqui? Pensei que tivesse tirando um pedaço. — Porque ninguém vai perceber e você não vai se sentir marcada... Aqui embaixo só eu e você veremos. Tornou a fitar aqueles furos e o rosto de Max com um pequeno fio de sangue perto dos lábios e uma onda nauseante a tomou. Levantou-se rápido e correu para o banheiro e ele seguiu em seu encalço. Vomitou e nada saía do estômago, além da bílis. — Está usando qual anticoncepcional? – questionou ele com os braços ao redor de sua cintura. Um frio subiu a coluna. Pensou em mentir. — Nenhum – Max descobriria. — Está grávida, Suna – ele se exasperou e a pressionou contra seu corpo. — E eu fiz isso com você agora. Meu Deus, não te mereço. Nem mereço essa felicidade. — Não acho que esteja grávida, imagino que foi por causa do sangue – ela queria se enganar. Max a virou para ele e a ergueu, sorrindo e eufórico. — Deus, vou ser pai! Não podíamos fazer amor desse jeito... – ele a colocou no chão de novo e a beijou. Quis refutar o contato, pois havia vomitado, mas ele insistiu. — Deixe de ser boba. Agora vamos nos limpar e depois iremos numa emergência fazer os exames, é rápido. — Não! Não vamos sair, tínhamos combinado, por causa das ameaças. Eu... eu também marquei minha médica, na quarta-feira... — Não esperarei tanto tempo – entraram no chuveiro juntos e ele a abraçou. — Meu Deus, como estou feliz! Eu sou o homem mais feliz do mundo com você – ele baixou e beijou seu ventre. — Pode não ser, não vamos comemorar agora... — Suna, você é louca. Não podíamos transar como fizemos, ficará de repouso. Não sabia o que dizer, nem o que pensar. Tinha medo dos próprios pensamentos. Afinal, toda aquela permissão a Max não havia sido nada, exceto pela expectativa de uma mordida. Além disso, desconfiado de sua gravidez a cabeça dele viraria um inferno de medo e culpa. Ele voltou a mirá-la. — Isso que aconteceu hoje, não vai voltar a acontecer de novo. — Foi menos pior do que imaginava... – confessou. — Ainda assim. Você é a mulher da minha vida, a mãe de meu filho. — Pare, Max não sabemos. — Está sim, eu sinto... – ele falava sem conseguir esconder o riso. — Agora se prepara para o ardor – ele ensaboou a mão e a passou em sua virilha e pernas, fazendo-a soltar um gritinho...
CAPITULOS 31
INFINITAS GALAXIAS
Os dias de Vicente Max e Suna se tornaram uma balança, em que o fiel se alternava de um lado a outro, ora envoltos de temores, ora, de felicidade. Afinal, um teste rápido de farmácia, realizado no domingo, havia confirmado que ela estava grávida. Os olhos de Max se encheram de lágrimas ao mirar as duas listinhas rosa da fita. Por alguns segundos, não disseram nada um ao outro, até que ele caíra numa mistura de choro e gargalhadas, abraçando-se. A reação dele a fizera chorar como se não houvesse mais emoções no mundo. E eram, justo, as emoções intensas que passaram a norteá-los. Não saía da mente de Suna o cuidado e o carinho que Max dedicava a ela. No instante em que havia entregado a fita do teste de gravidez, ele a deitara na cama, retirara a sua roupa, deixando-a apenas de lingerie e passara o restante do domingo, literalmente, acariciando e beijando sua barriga. É claro, além de ignorar as próprias excitações. Sentira-se a mulher mais importante e feliz entre as infinitas galáxias. Se ele já era homem presente e intenso, poderia confidenciar que se tornara exponencialmente maior o interesse dele em seu bem-estar. E aquilo a preocupava. A pedido do marido permanecera em casa na segunda e na terça-feira. Se ficar de repouso o acalmava, resolvera atender aquele pedido. Também decidiram não contar a ninguém sobre a gestação até que mais algumas semanas se passassem e o imbróglio das ameaças e incêndios, ao menos, apontassem para alguma solução. Nos últimos dois dias, Max só saíra para atender pacientes e voltara logo para casa. No tempo juntos, eles se acostumavam a ideia de que teriam um filho e seriam pais. Faziam planos e tentavam decidir sobre nomes. — Prefiro Gabriel, Mateus ou Pedro – sugerira Max. — E, para menina, gosto de Sofia, Ester, Isabella e ... Suna – eles riram. — Sério! Seu nome é muito lindo. Encho a boca para chamá-lo, nunca percebeu? – acariciara a face dele e o enchera de beijinhos. — Desde quando é assíduo nas escrituras? – questionara ela e ele revirara os olhos, esboçando o sorriso. — Afinal, só escolheu nomes bíblicos, exceto o meu que é árabe. Nem sei onde minha mãe encontrou essa inspiração – observara. — Que tal João Vicente? Acho lindo. — Se for menino, João Vicente, sério? — Sim, quase igual ao pai... Ele a envolveu nos braços. — E nomes femininos, o que sugere? — Prefiro nomes pequenos, como June, Nina ou Luna. — São nomes lindos. Luna parece com Suna, significa lua em italiano e espanhol – acrescentara ele. — Sim. E significa iluminada, feminina... e em algumas variações, a deusa da lua. Também amo June, que é a deusa grega da bondade – explicara ela. — Andou pesquisando, hein? A única certeza que tenho é que se for menina e parecer com você, vou estar em maus lençóis com duas teimosas e cabeças duras em minha vida... Rira. — Ah! Se for menino ou menina e puxar a você, eu que não terei mais paz com tanto charme e sex appeal a seduzir potenciais parceiros por aí. — Para com isso – sorrira ele e depois havia ficado sério. — Só não quero que seja como eu... com um lado obscuro dentro de si. Sempre tive medo disso... – o olhar dele parecera perdido. — Agora você quem vai interromper esses pensamentos. Não tem lado obscuro, Max, tem um intenso jeito de ser. Além de que, é um homem seguro e inteligente. Se nosso filho ou filha herdar isso já estarei mais que satisfeita – concluíra com um estranho aperto no coração. Abraçaram-se, reflexivos, sobre a cama. Mantiveram-se, por longas horas, descansando e sentindo a forte energia do amor que os envolvia, pairando, como uma imensa e translúcida bruma de luz. Tinham sido momentos reconfortantes, intensos, entre beijos carinhosos e afagos carregados de afeto, que forjavam no fogo invisível do amor os elos que os uniam, envolvendo seus corpos, corações, mentes e almas em longos cordões fortalecidos e inquebráveis. Não foram necessárias palavras para que fossem renovados os compromissos e validados os fortes laços que os tornavam quase um só. Eram uma amálgama de peles, olhares, toques e energia. Na segunda-feira pela manhã, havia ficado pronto o laudo de vistoria de seu carro, o que confirmava que houve um atentado. Pelo que disseram, um dispositivo tinha sido introduzido próximo ao reservatório de partida. Aquilo lhe causara calafrios, pois não se tratava de ações amadoras. Marcel dissera que a polícia estava vasculhando as imagens de câmeras situadas onde estivera no dia do incidente, em busca de pistas. O medo a importunava. E o fiel da balança oscilava. Com o semblante triste, Dulce parecera desconfiada da presença de Vilma, a moça parruda da empresa de segurança. Mesmo que Vilma estivesse à paisana, Dulce era uma mulher inteligente e deve ter entendido o que acontecia, tanto que nada lhe perguntara sobre a presença da moça. E aquilo lhe partira o coração ao fitar o rosto da governanta. No entanto, na terça-feira, após dormir no início da tarde, de ressaca de suas náuseas, Dulce e Vilma pareciam ter engatado uma amizade quase de comadre, o que a deixara menos culpada. Naquele quarta-feira, antes de sair para sua primeira consulta, arrumando as roupas no armário, a governanta a abordara. — Entendo o que está acontecendo, Suna – apenas fitara Dulce de modo apreensivo. — Espero que tudo isso passe e a vida volte ao normal. Também desejo que esse bebê venha alegrar ainda mais essa casa. Aquelas palavras ditas, carregadas de emoção, fizera com que desabasse. Abraçara Dulce, choramingando. — Estou com medo. E me desculpe qualquer coisa. Estamos seguindo o que foi traçado pela equipe de segurança. — Entendo, garota – ela afagara suas ancas, com os olhos vidrados e os músculos do rosto contraído, controlando a emoção. — Como sabe que estou grávida? — Desde quando é chorona e preguiçosa, a ponto de passar tardes na cama? – elas riram cúmplices. — Só uma gravidez para te frear – Dulce contraíra a face, como numa incógnita. — Vou formar no final do ano e quero muito você e doutor Vicente lá. — Claro que vamos, Dulce... é claro. Enfim, naquele instante, acabara de sair de sua primeira consulta pré-natal. Max iria acompanhá-la em sua ida à obstetra, contudo, por volta do meio-dia, ele havia passado uma mensagem, avisando sobre uma cirurgia de emergência que precisaria fazer. Ficara um pouco frustrada, mas entendia a profissão do marido. O exame de ultrassonografia apontava para uma gestação entre oito e nove semanas, em que já era possível escutar os batimentos cardíacos de seu bebê. Provavelmente, tenha engravidado logo que eles reataram, nos dois dias de amor, no quarto Afrodite. Max vai gostar de saber disso, pensou. Afinal, aquela nova vida, que pulsava dentro de si, surgira da dança de seus corpos, do sexo ardente que eles faziam. Apanhara uma cópia das imagens do embrião e do som do coraçãozinho para mostrar a Max. Na verdade, foi aquele som ritmado e rápido, o bater do minúsculo coração, que irrigava um corpo que mal existia, que a fez ter uma noção concreta da sua realidade. A ficha caiu e gostaria de ter Max ao seu lado. O tamanho da responsabilidade a amedrontava. Carregava um ser que cresceria dentro de si e, posteriormente, nasceria, ficando à mercê de seus cuidados para sobreviver. Teria que alimentar, zelar, cuidar de suas dores e entender a linguagem daqueles lamentos. Era como se o próprio corpo fosse capaz de se dividir, criando e cedendo espaço para uma outra alma habitar. Era um broto de uma rosa que vinha frágil e delicado, mas com uma força imperial e resignante, para desabrochar em beleza e suavidade; ou ainda, uma estrela robusta e misteriosa, que brilharia por milhares de anos, mas que nascia entre brumas nebulosas e instáveis. Aquilo era um milagre. E, por aquele dom, tornava-se uma mulher especial, dotada do poder da continuidade, de ser capaz de gestar e ser guardiã de vidas. Havia ficado muito emocionada. Saíra do consultório atônica, com lágrimas de emoção entremeando os olhos. Vilma a acompanhava em silêncio. Entrou no hatch azul perolado, que Max já havia comprado e lhe entregara as chaves com o Documento Único de Transferência do veículo em seu nome. Era um automóvel confortável, leve e arrojado, além de ser uma delícia para dirigir. Ligou para o médico, mas ele ainda não atendia. Enviou-lhe mensagens, pedindo que fosse logo para casa, que queria muito vê-lo e que estava tudo bem com o bebezinho deles. Pensou em procurar Maya, que assumira as obras de recuperação da Doces Amores, mas acabou desistindo da ideia. A amiga iria cercá-la de perguntas e tinha combinado com Marcel e Max de nada comentar. Respirou fundo e foi ao laboratório fazer o exame de sexagem fetal, para descobrir se esperava um menino ou uma menina. Acabou adiantando todos os outros, pedidos pela médica, e que não precisava de jejum. Seu instinto começava a murmurar que esperava uma garotinha. Após sair do laboratório, passou na farmácia e comprou as medicações prescritas, um complexo vitamínico e remédio para enjoo. Antes de sair do local, verificou o aplicativo do celular em busca de mensagem de Max, mas ele nem tinha lido as que enviara. O coração apertava ansiosa. Então, resolveu ir ao shopping fazer as primeiras compras para o bebê. Queria a opinião dele, mas depois concluiu que o deixaria feliz ao lhe mostrar algumas pecinhas de roupas, quando ele chegasse em casa. Andou por várias lojas que nunca tinha entrado antes e foi inteirando-se naquele novo mundo que envolvia a maternidade. Comprou chocalho, chupeta, macacãozinho, camisetas e um tênis, no estilo All-Star, vermelho e bem pequenino. Escolheu também algumas fraldas de pano e mantinhas, todas na cor branca. Sonhava acordada com o sorriso de Max ao assistir às imagens do ultrassom, escutar os batimentos e tocar nas roupinhas. Ele se emocionaria, iria querer comprar te tudo que encontrasse para recém-nascidos. Por final, avistou um ursinho de tecido colorido e levou. Voltou a verificar o aplicativo e não havia mensagem, nem ele tinha visto as suas. Deveria estar enfrentando alguma complexa cirurgia. Recordou-se da mãe e da avó. Havia ligado para dona Fátima, confidenciando sobre a gravidez, na segunda-feira. A mãe fez uma festa de tão alegre que havia ficado, no entanto, pedira que contasse apenas a sua avó, Bené, e guardasse segredo para as outras pessoas. A verdade era que não queria que Beatriz soubesse tão cedo. Tinha um receio bobo e sem fundamentos, pois Max continuava a bancar o tratamento dela e dos filhos, embora ela tenha escolhido passar mais tempo em São Sebastião, na companhia de Zé Kirin. Aos poucos, ele e Beatriz estavam reatando e o velho Kirin parecia ter remoçado mais de dez anos. Desejava vida longa ao casal. Quando chegou em casa, a tarde já partia e nada de notícias de Max. Começava a ficar preocupada. Pela enésima vez, observou o aplicativo do celular e ele nem tinha visto suas mensagens. Será que ainda estava no centro cirúrgico? Andou de um lado para o outro do quarto, sob os olhares atentos de Zazá. Vilma já tinha terminado seu turno e, como Dulce, tinha partido. Sentou na cama pensativa, colocou a gata no colo e acariciou sua pelagem tigrada. Ligou para um dos seguranças que acompanhava Max. Segundo o rapaz, ele ainda estava no hospital. Respirou fundo com estranhamento. Sim, sabia que Max enfrentava procedimentos de longa duração. Controlou o ar dos pulmões para que saísse do peito de modo lento e, com isso, se acalmasse. Não, Suna. Nada demais aconteceu, convencia-se. A equipe de segurança foi dividida em dois profissionais para cada um deles, além dos que se revezavam no acesso ao apartamento, por vinte e quatro horas. Vilma ficava diretamente com ela, mas os seus passos eram seguidos por outro contratado. Já Max contava com o acompanhamento de dois seguranças. Desde domingo, estavam vivendo daquela forma. Levantou-se e organizou as compras do neném do lado de Max na cama, na expectativa da chegada dele. Colocou o ursinho colorido entre os travesseiros e o par te tênis sobre o macacãozinho branco. Executava cada movimento com calma, mas sua atenção estava no celular que mantinha grudado no cós da calça a espera que vibrasse. Concluiu a arrumação e a angústia aumentava. Outra vez, observou o aplicativo e um vazio frustrante se apossou do coração. Ligou para Diego, afinal, ele participava, como médico auxiliar, da maioria das cirurgias que Max fazia. A ligação chamou até cair na caixa-postal. Foi na cozinha. Precisava se alimentar, a obstetra a tinha orientado. Olhou a panela com sopa sobre o fogão, deixada por Dulce, colocou-a no prato. Tomou algumas colheradas e regurgitou com a última. Uma sensação ruim se apossou do peito, correu até a pia, abriu a torneira, molhou o rosto, lavou a boca e gritou, sem dar atenção a Zazá que se abeirava de suas pernas. Lembrou-se do conteúdo do cartão do buquê de talos. Apanhou o celular e ligou para o setor de enfermagem do centro cirúrgico do hospital. — Boa noite, sou esposa de doutor Vicente Maximo ... eu queria saber se ele ainda está operando? — Senhora, não podemos dar esse tipo de informação – explicava a moça do outro lado da linha. Fechou os olhos e teve vontade de xingar, então, recordou-se do nome de uma das enfermeiras de lá. — Gostaria de falar com a enfermeira Viviane. — Desculpe, senhora, não é o plantão dela hoje. — Quem é a enfermeira responsável? – a tensão só aumentava. — Por favor, estou precisando de notícias de meu marido... — Um momento... – a moça parecia conversar com outra pessoa ao seu lado. — Desculpe, senhora... por favor, qual o seu nome? – continuava ela. — Suna, Suna Ferraz... Maximo – mentia, ainda nem tinha aquele sobrenome. — É... deve estar acontecendo algum mal-entendido, dona Suna... Doutor Vicente saiu do procedimento no início da tarde, daqui do Santa Efigênia. Talvez, a senhora tenha se enganado e ele esteja operando em outro hospital agora à noite... – apoiava-se na bancada. Os seguranças esperavam Max naquele hospital. Um calafrio subiu pela espinha. — Obrigada – tentava apertar o botão vermelho para encerrar a ligação. Finalmente, conseguiu completar outra ligação para o irmão, Marcel. As carnes tremiam. Tinha impressão de que poderia desmaiar a qualquer instante. — Max desapareceu – conseguiu dizer num jato esganiçado de voz assim que ele atendeu. — Como assim? — Ele operou no Santa Efigênia, os seguranças estão lá, ele não. Eu mandei mensagem, ele não viu minhas mensagens – não conseguia falar com coerência. — Explica pausadamente, Suna, por favor. — Max sumiu, Marcel – gritou e caiu no choro convulsivo. — Max sumiu, faz alguma coisa, pelo amor de Deus – parecia estar sendo sugada por um buraco negro. Observou ao redor da cozinha e tudo girava.
Amanhã tem os capítulos finais.
😍
ResponderExcluirNão acredito q sequestraram ele
ResponderExcluir😭😭😍😍
ResponderExcluir😳😳😳😳
ResponderExcluirAgora vai começar as torturas, quem será que está ir traz desse sequestro
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